Maria tinha poucos anos quando começou a acreditar que não valia nada. Cresceu a ouvir da mãe frases como “não serves para nada” ou “não fazes nada de jeito”. Palavras que, para quem as diz, podem parecer inofensivas ou até educativas, mas que, para uma criança, têm um peso imenso. Já José, um adolescente tímido e criativo, enfrentava o Bullying na escola diariamente. Os colegas chamavam-lhe nomes, roubavam-lhe os materiais e faziam-no sentir-se invisível. Quando os professores informaram os pais do José sobre o problema, a reação não foi acolhedora: José foi castigado em casa, como se ele fosse o culpado pela violência que sofria.
Essas histórias são das personagens que ilustram o impacto do ambiente familiar nas dinâmicas de violência e na reprodução de padrões de Bullying, relatadas no livro “Eva Entrega a Costela a Adão”, que explora, entre outras coisas, como as palavras e as atitudes dentro de casa podem moldar a forma como as crianças e os jovens lidam com o mundo. Tanto Maria quanto José carregam as marcas do que viveram – e mostram como a família pode ser tanto um espaço de acolhimento quanto de perpetuação de violência.
A família é o primeiro ambiente onde aprendemos sobre o mundo.
É ali que crianças e jovens desenvolvem valores, comportamentos e crenças. No entanto, nem sempre este espaço é de acolhimento e segurança. Quando pais ou cuidadores utilizam palavras duras, desvalorizam sentimentos ou adotam uma comunicação agressiva, ensinam, muitas vezes de forma inconsciente, que a violência é uma resposta aceitável.
Por outro lado, um ambiente familiar acolhedor, baseado no respeito e na empatia, ajuda as crianças a desenvolverem autoestima, confiança e resiliência. Essas crianças têm maior probabilidade de reagir ao Bullying com segurança e procurar ajuda quando necessário.
No caso de Maria, as constantes críticas fizeram-na sentir-se incapaz, abrindo caminho para uma baixa autoestima que se refletiu em dificuldades de relacionamento. Já José, sem o apoio da família, aprendeu que era inútil procurar ajuda, aceitando a violência como uma realidade inevitável.
É possível reverter este cenário, mas exige esforço, reflexão e mudanças práticas no dia-a-dia.
A Associação Amar Eva tem trabalhado ativamente para ajudar famílias a reconhecerem estas dinâmicas e a transformarem a forma como se relacionam.
Com sessões de mentoria individual, ajudamos pais a identificar comportamentos prejudiciais e a desenvolver estratégias para construir um ambiente mais saudável. Também apoiamos jovens como José e Maria, oferecendo orientação emocional e ferramentas para lidar com o Bullying de forma assertiva. Além disso, promovemos ações para a comunidade escolar, capacitando professores e educadores para intervirem eficazmente.
No entanto, a mudança começa em casa. Eis algumas estratégias que qualquer família pode adotar:
- Criar um espaço de diálogo aberto: Perguntar diariamente às crianças como foi o dia e realmente ouvir as respostas.
- Evitar críticas destrutivas: Substituir frases como “nunca fazes nada bem” por “o que podemos fazer para melhorar isso juntos?”.
- Promover igualdade dentro de casa: Distribuir responsabilidades de forma justa e evitar comparações entre irmãos.
- Dar o exemplo: Crianças aprendem mais com o que os pais fazem do que com o que dizem. Respeitar e ouvir as crianças é a melhor forma de ensiná-las a fazer o mesmo.
O Bullying não é um problema isolado ou apenas escolar; muitas vezes, tem raízes na dinâmica familiar. Como demonstrado em “Eva Entrega a Costela a Adão”, pequenas ações – como uma palavra de encorajamento ou uma conversa atenta – podem ter um impacto profundo na vida de uma criança.
A Associação Amar Eva acredita que a transformação começa com a educação. Trabalhamos para sensibilizar famílias e escolas, promovendo uma cultura de respeito, empatia e comunicação. Queremos ajudar mais Marias a sentirem-se valorizadas e mais Josés a encontrarem acolhimento e força dentro de casa.
A mudança não é fácil, mas é possível. E começa com cada um de nós.
Fernanda Ferreira
Associação Amar Eva “Construímos pontes de Amor desde a infância”