Jo Stenuit, Director de Design da Mazda Motor Europe, partilha as suas fontes de inspiração, os factores que influenciam o seu trabalho e a sua perspectiva do que está a mudar no design automóvel, fruto da electrificação dos veículos.
Está na Mazda há mais de 20 anos. Como descreveria a evolução do design na Mazda ao longo desse período?
Ao longo das últimas décadas tivemos diferentes filosofias de design, como o “Tokimeki”, o “Nagare” e o actual “Kodo”. Embora, obviamente, sejam diferentes entre si, o principal objectivo foi sempre o mesmo: demonstrar que os nossos automóveis proporcionam prazer de condução. A maior alteração dos últimos 10 anos assenta no facto de que concentrámos os nossos esforços em formas de expressão cada vez mais artísticas e premium.
Isto significa que voltámos às origens do melhor do design automóvel. Os muitos prémios e distinções que temos obtido são a confirmação de que os nossos clientes e fãs, de todo o mundo, entendem e apreciam esta abordagem, processo que não teria sido possível sem a estreita colaboração dos estúdios de design da Mazda no Japão, Europa e EUA.
Como caracteriza a mais recente evolução do design Kodo?
A atenção aos detalhes é um factor essencial. A segunda fase do design Kodo gira em torno da pureza e conta com linhas emocionais, recorrendo ao menor número possível de elementos, algo que só pode ser alcançado se esses elementos forem criados segundo os mais elevados padrões. Na concepção do design exterior, empregamos muito tempo na colocação de todos os elementos em equilíbrio e harmonia, garantindo que os reflexos exteriores dos veículos são o mais dinâmicos e perfeitos possível. Já no habitáculo, esforçamo-nos em tornar a experiência sempre tão convidativa e positiva como a vivida na primeira vez em que os nossos clientes entraram num automóvel. Organizamos os interiores com precisão, limitando o número de elementos de design e refinando os materiais até à perfeição.
Mas a excelência do design vai além do próprio veículo. Juntamente com nossos colegas dos departamentos de Estilo, de Marketing e de Comunicação conseguimos criar e estabelecer um ambiente específico para os nossos modelos e para a nossa marca, que reflete as aspirações premium da Mazda. Ao fazê-lo, conciliamos meticulosamente texto, grafismo, fotografia e arquitectura. Esta atenção aos detalhes demonstra a paixão dos nossos designers, bem como a nossa confiança nos produtos e na marca Mazda.
Como classifica a evolução da Mazda no sentido do design topo de gama?
É a consequência lógica da nossa busca por valores únicos em termos de produto e experiência de marca. Num mundo em que tudo acontece cada vez mais rapidamente e onde as tendências de design mudam constantemente, a Mazda oferece uma alternativa intemporal, sofisticada e bem articulada. A beleza só funciona quando é criada com emoção, dedicação aos detalhes e um elevado grau de confiança e de humildade.
O tom azul escuro está actualmente a revelar-se uma tendência em alta no design de interiores. Também se aplica no interior dos automóveis?
Sinceramente, já experimentámos o azul escuro, mas somos altamente cautelosos em replicar tendências sazonais nos nossos veículos. Temos de pensar muito mais a um longo prazo. Dito isto, a cortiça é atualmente muito apreciada e é um material que se adequa muito bem à Mazda, marca que começou como fabricante de cortiça. De qualquer forma, há uma grande tendência para a qualidade, pelo que procuramos metodicamente materiais com essa característica, junto com um foco especial em sustentabilidade.
Por exemplo, no Mazda MX-30[1] utilizamos vários materiais com uma taxa de reciclagem até aos 100%. Outra das tendências incide nas tecnologias integradas, numa altura em que quantidade de informação já começa a ser excessiva, pelo que precisamos de evitar uma sobrecarga sensorial. Na década de 1980, os interiores de alguns concept cars começavam a parecer autênticas árvores de Natal, tendência que não durou muito tempo.
O que deve oferecer, então, um interior de um automóvel?
Deve proporcionar uma sensação imediata de conforto e de tranquilidade. Para tal, é fundamental introduzir materiais e cores atractivas mas de uma forma moderada. O habitáculo requer um design simples e de alta qualidade, e isso é o bastante!
Os automóveis antigos fazem-no muito bem: são honestos e simples. Tenho um Datsun de 1971, um carro tão minimalista que o único equipamento interior é um rádio. É algo que acalma as mentes, pelo que penso que temos de voltar a essa simplicidade. Na Mazda, é claramente isso que estamos a fazer: os nossos interiores são muito simples.
Até que ponto deve o interior de um automóvel ser um espaço para viver?
O mais possível, na minha opinião. Deve ser muito confortável, como acontece no Mazda MX-30. É reconfortante estar sentado num ambiente desse tipo. Os automóveis elétricos vão reforçar esse conceito, pois, uma vez que, de um modo geral, se deslocam a velocidades reduzidas, o habitáculo assume uma maior importância. Ou seja, o habitáculo deve ser um espaço agradável e descontraído. Estamos a ver cada vez mais este tipo de conceito em protótipos de veículos autónomos, cujos habitáculos parecem salas de estar.
[1] Mazda MX-30 eSkyactiv (valores combinados, WLTP – Consumo de electricidade: 19 kWh/100km; Emissões de CO2: 0 g/km. Veículos homologados de acordo com a nova norma WLTP (Reg. (EU) 1151 / 2017; Reg. (EU) 2007/715).
Como se exploram novas ideias? E como podemos definir o processo de design de um veículo, especialmente o de um modelo eléctrico?
Como quase sempre, tudo começa com uma folha de papel em branco. Anotamos as nossas ideias iniciais com base na percepção do quotidiano como designers e, obviamente, do mercado e dos dados técnicos fornecidos por outros departamentos. Os primeiros automóveis eléctricos lançados no mercado pareciam muito futuristas, como se dissessem “vejam, aqui está algo novo!” Hoje estes modelos já não precisam de chocar as pessoas, apresentando-se cada vez mais normais.
Contudo, os propulsores eléctricos mudaram os conceitos estruturais dos veículos. Até há bem pouco tempo, a frente de um automóvel era dominada pela grelha do radiador, que lhe conferia uma expressão facial. Mas isso está a mudar, sendo que agora temos motores integrados nas rodas, o que deixa muito espaço livre para projetar algo novo, recorrendo ao vidro, por exemplo. Com um simples olhar para a carroçaria, qualquer pessoa percebe, de imediato, se se trata de um automóvel eléctrico.
Por outras palavras, projetar um veículo, seja eléctrico ou com motor de combustão interna, começa com a pergunta: “O que é que as pessoas precisam neste automóvel?” É esse o nosso trabalho!
E o que mais está a mudar?
A maior parte das mudanças estão a ter lugar no habitáculo. Num veículo eléctrico a sensação é diferente, sendo que também o conduzimos de uma forma diferente. O Mazda MX-30 é um mundo completamente diferente do Mazda3, cujo interior está focado no condutor, acima de tudo. O habitáculo do MX-30 transmite maior tranquilidade, descontracção e equilíbrio, enquanto o seu interior também parece mais reservado, dedicado e espaçoso, como se fosse uma extensão da nossa sala de estar.
Como se concebe um habitáculo com um ambiente tranquilo?
Também aqui tudo começa a partir de um espaço vazio. Depois olhamos para o que é realmente necessário, certificando-nos de que não estamos a exagerar. Como japoneses, na Mazda somos muito minimalistas, ao contrário de outras marcas que tentam, muitas vezes, colocar o máximo de coisas possíveis no habitáculo. Mas essa não é a nossa filosofia. Demasiadas coisas só contribuem para agitar e sobrecarregar as pessoas, para além de que esse tipo de abundância significa que há funcionalidades que ninguém usa.
Outro ponto é o facto de a tecnologia evoluir mais rapidamente do que as pessoas se conseguem adaptar a ela. Em resultado, nem sempre é necessário ter tantas coisas novas no nosso automóvel. Para nós, o prazer de condução continua a ser a principal prioridade e isto também se aplica aos modelos eléctricos.